ARTIGO: Carne bovina e o erro do ativismo ambiental

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Cerca de 10% da população mundial ainda busca suas fontes de proteína na natureza

 

Em recente artigo publicado em “O Estado de São Paulo”, Marcos Jank informa que mais de 800 milhões de pessoas se alimentam de animais silvestres, por razões nutricionais. Esse montante totaliza 10% da população mundial e se concentra basicamente na Ásia e na África. O autor lembra que esse consumo nem sempre ocorre com grandes aglomerações em mercados de animais vivos como em Wuhan, na China, cujo caso ficou conhecido pela suspeita de ter sido o ponto inicial da epidemia do Covid-19.

Essa informação expõe um enorme equívoco em relação às medidas defendidas pelo ativismo ambiental. Com base em metodologias duvidosas, ativistas defendem que a produção pecuária, especialmente a bovinocultura, é a responsável por grande parte das emissões de carbono e, consequentemente, teriam impacto relevante nos fatores de mudança climática global. Recomendam, assim, a redução no consumo.

O mundo todo desacelerou as atividades urbanas e os institutos especializados relatam quedas significativas nos índices de poluição em praticamente todas as regiões monitoradas. O agro não parou. Bovinos continuam ruminando e, consequentemente, emitindo sua dose diária de metano. Em 2020 temos cerca de 10 milhões de bovinos a mais no planeta.

Os métodos que concluem os malefícios da produção pecuária são falhos e incompletos, pois desconsideram a quantidade de carbono removida pelo sistema de produção.

Quando a produção é eficiente, a remoção de carbono da atmosfera – pelas plantas e pelo solo – acaba superando a quantidade emitida pelos bovinos. Por essa razão, a produção de carne bovina não é a causa do aumento das emissões de gases.

O que poderia estar relacionado à pecuária é o desmatamento e consequente mudança de uso de solo. No entanto, há um fato que quase nunca é levado em conta quando se analisa essa relação.

A pecuária nunca foi, e continua não sendo, a causa do desmatamento. A pecuária é consequência. A motivação para o desmatamento ilegal não é a produção de carne, mas sim os ganhos fáceis advindos de uma atividade sem controle. Madeireiros ilegais, grileiros, garimpeiros e toda sorte de oportunistas avançam sobre a floresta, transformam-na e iniciam uma atividade pecuária, igualmente ilegal.

É fundamental que se separe o joio do trigo. Controlar atividades ilegais, corrupção em cartórios e em órgãos fiscalizadores e combater a informalidade na produção de carne são os métodos mais eficientes de se controlar o desmatamento ilegal.

Nesse caso, a pecuária é parceira; está muito mais do lado da solução do que do problema.

Atualmente, os produtores operam com produtividade média de 65 quilogramas de carcaça por hectare, 75% a mais do que registrava há 20 anos. Apesar do avanço, os dados do Rally da Pecuária – expedição anual que entrevista pecuaristas em 11 estados – evidenciam o potencial da produção tropical.

A média do público entrevistado, que está bem acima da realidade brasileira, atinge 200 quilogramas de carcaça por hectare ao ano.

Analisando apenas os 20% mais produtivos dessa mesma amostra, a quantidade de carne produzida por hectare chega a 840 quilogramas de carcaça, 13 vezes mais do que é obtido pela média da produção brasileira.

E os níveis de produtividade não param de aumentar. Entre 2011 e 2019, a expedição vem registrando aumento médio nos níveis de produtividade em torno de 8% ao ano.

Do ponto de vista do carbono, estima-se que sistemas mais produtivos possam remover entre 3 e 5 moléculas de equivalente gás carbônico para cada molécula emitida pelos bovinos. Embrapa e universidades brasileiras reúnem estudos e conhecimento de sobra sobre o assunto. E, muitas vezes, ONGs e entidades do governo vão buscar informações lá fora. Não há, no planeta, povo que conheça melhor a produção no sistema tropical do que os brasileiros.

O desafio da produção de carne no ambiente tropical, com sustentabilidade, já foi superado.  Resta agora aumentar o ritmo e ampliar a quantidade de sistemas de produção mais intensivos.

Não se trata de ajudar ou subsidiar, muito pelo contrário, visto que a produtividade só avança com a perspectiva de lucros em ambiente de alta competição, típico da produção de commodities.

A sociedade, por meio de políticas públicas, irá acelerar esses avanços informando melhor os consumidores, internos e externos, reconhecendo e valorizando os sistemas de produção como solução sustentável para a oferta de proteína à população.

É importante também direcionar os esforços da fiscalização àqueles que operam na ilegalidade, e não apenas à cadeia produtiva organizada. É essa última que garante fartura e qualidade na produção de carne, desenvolvimento e produção sustentável.

Por incrível que pareça, muitas das medidas adotadas por pressão de ambientalistas acabam mais atrapalhando do que ajudando. Isso acontece por tornar a produção fiscalizada menos competitiva diante da produção informal e ilegal. Pune-se o legal, premia-se o ilegal.

O caminho da sustentabilidade é mais fácil de ser trilhado do que parece. Basta proporcionar condições para que os sistemas intensivos, já em crescimento, avancem mais, ocupem mais espaços e atraiam um número cada vez maior de produtores e indústrias.

Se a preocupação do mundo todo é proteger florestas, nada mais importante do que evitar a relação extrativista entre o Homem e os produtos que estão lá. Isso vale para espécies florestais e animais. Apesar de outros casos já serem conhecidos pela sociedade, como HIV, Ebola e outras influenzas, a intensidade do impacto do Covid-19 elevará a importância de atenção com relação à fauna e a qualidade da nutrição das populações mais pobres. Combater a fome não será suficiente, é preciso garantir qualidade dos alimentos.

Enganam-se os que acreditam que a alternativa seja reduzir o consumo de carne. A disponibilidade de proteína para cada pessoa do planeta é pequena e não há razão nenhuma para crer que o Homem deixará de consumir um alimento tão relacionado à própria existência.

Mais de 800 milhões de pessoas espalhadas pelo mundo, de diferentes culturas, provam isso diariamente.

Está na hora do ambientalismo reavaliar os seus conceitos. Barrar o consumo de proteínas pela população só será possível pela força o que, em outras palavras, implica em imposição ditatorial.

 

Por Maurício Palma Nogueira, engenheiro agrônomo e diretor da Athenagro

A análise, encomendada pela Abiec, foi feita pela Athenagro Consultoria.

Dados:

Fonte: Athenagro, Rally da Pecuária

Artigo do Marcos Jank: https://www.linkedin.com/pulse/um-alerta-global-para-zoonoses-e-seguran%25C3%25A7a-do-alimento-marcos-jank/?trackingId=hSEjhddfRc24HKEO4WhJ7w%3D%3D

 

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